Fadiga pandêmica: como nos tornamos uma sociedade cansada

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Sobrecarga de teletrabalho, zoom fadiga, burnout: essas são apenas algumas das consequências da pandemia na saúde mental das pessoas.

Mesmo após uma noite de sono, você acorda com cansaço, se irrita com facilidade, sofre de ansiedade ou tem a sensação de se encontrar no limite?

Se sim, saiba que você não está só.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) denominou de fadiga pandêmica o cansaço derivado do esgotamento gerado pela hipervigilância e pelo medo do vírus.

A fadiga pandêmica estressa nosso sistema hormonal e endócrino de maneira constante, tornando-nos mais vulneráveis a certos transtornos, como a ansiedade e a depressão.

Além disso, a situação política e econômica instável e a incerteza quanto ao futuro da pandemia estão criando um desgaste cumulativo

A esses fatores, a OMS soma a privação de liberdade derivada do isolamento, a falta do convívio social e o tédio. 

Mas porque estamos nos sentindo tão exaustos se na prática passamos a ter tempo para algumas atividades que a rotina de uma vida acelerada nos impedia de ter, como estar mais presente com a família ou cultivar uma rotina que teoricamente deveria ser mais saudável?

O pensador coreano contemporâneo, Byung-Chul Han, propõe uma visão de sociedade intitulada “Sociedade do Cansaço”, em que o sintoma principal é a fadiga mental e física decorrente do excesso de positividade e cobrança de rendimento.

A sociedade do cansaço não é fruto da era pandêmica

Antes da pandemia, o filósofo Byung-Chul Han já falava de um mundo em que as pessoas viviam a angústia de achar que não faziam tudo o que poderia ser feito.

Mesmo sem perceber, vivíamos num momento em que o discurso que imperava era:

“Você pode ser e fazer o que quiser”.

“Descubra sua melhor versão”.

Ou seja, a boa e velha meritocracia nos trouxe a ideia de que até mesmo a felicidade era uma questão de merecimento.

E essa positividade tóxica acabou por nos transformar em escravos de nós mesmos.

O autor aborda o que seria a formação de uma sociedade do desempenho no século XXI, contrapondo a sociedade disciplinar do século XX.

Enquanto uma versa sobre o indivíduo obediente, da hierarquia e da não possibilidade.

A primeira valoriza o indivíduo do desempenho, onde a cobrança externa se desloca para uma cobrança interna.

Onde o indivíduo, cada vez mais narcísico, não consegue definir claramente seus limites próprios, vivendo uma lógica do sim absoluto: “sim, nós podemos” (Yes, we can!).

E o não alcance desse ideal se desencadeia em fracasso, onipotência e sofrimento. 

Nessa busca desenfreada pela produtividade, não é mais permitido nos dar um dia de folga, um momento de contemplação.

O tédio passou a ser sinônimo de preguiça.

[Não vivemos mais em uma sociedade disciplinar controlada por ordens ou proibições, mas sim em uma sociedade orientada para a realização de uma suposta liberdade marcada pelo lema “Sim, nós podemos”.

Porém isso cria no início apenas uma sensação de liberdade.

Assim, mais compulsões são produzidas com o “você deve”.

Presumimos que somos livres, mas na verdade nos exploramos apaixonadamente até entrarmos em colapso.] Byung-Chul Han

E o imperativo do desempenho nos leva ao esgotamento.

Mas não se vive bem sob essa pressão.

O cuidar de si envolve negar, envolve dizer Não.

Pois hoje, nós também adoecemos pela falta de negação.

O filósofo também menciona o sujeito multitasking, ou multitarefa, que diz respeito a fazermos diferentes coisas ao mesmo tempo.

O que neste contexto, agrava-se a sensação de fadiga.

E nesse ritmo acelerado, chegamos a um estado de colapso.

Não é à toa que os transtornos mais comuns atualmente sejam de ansiedade e pânico.

No atual contexto de pandemia, percebe-se ainda mais esse tipo de situação, já que a casa virou o ambiente de trabalho, onde a todo momento cumprimos alguma função.

O espaço público se misturou com o privado, e o nosso lar, que era um local de descanso, se tornou o ambiente para múltiplas tarefas.

Como podemos driblar os efeitos da sociedade do cansaço?

Primeiramente, é preciso um olhar para dentro para entendermos quem somos nós na sociedade do cansaço:


O sujeito multitarefa, que acumula funções?
O apático, que ‘narcotiza’ a vida?

Ou o que se contagia emocionalmente, absorvendo as dores do mundo?

Essa compreensão nos ajuda a adotar algumas atitudes práticas de autocuidado (calma, eu não vou te passar outras tarefas!) em nosso dia a dia, como:

Normalizar o que sentimos: é normal que possamos nos sentir tristes ou estressados

O bem-estar deve ser prioridade: busque momentos que te tirem do estado de tensão, como meditar, praticar uma atividade relaxante, cultivar algum hobby.

Viva o presente: precisamos focar no que depende de nós, no aqui e agora.

O autocuidado físico é importante: estabeleça uma rotina de exercícios, mesmo que simples, tenha uma boa alimentação e, se possível, busque tomar um pouco de sol.

Tenha momentos de descanso psicológico: permita-se desconectar. Não leia ou veja notícias que te fazem mal. Cultive momentos de puro ócio.

Por fim, para rebater a fadiga, busque realizar atividades que te recarreguem de energia positiva. 

Seja em contato consigo mesmo, ou compartilhando momentos (em segurança) com amigos e familiares: o convívio social é um excelente antídoto contra a fadiga.

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